Literatura
A História na versão do homem do Plim Plim
Luis Eduardo Souza Costa
A grosso modo, a televisão está para o Brasil assim como o cinema está para os EUA, o teatro para a Inglaterra e a literatura para a França. Às vezes arte, às vezes pop, muitas outras, lixo, a diferença fundamental é que ao contrário das manifestações citadas em seus respectivos países, a televisão brasileira sempre careceu de um registro histórico sólido de sua trajetória de pouco mais de 60 anos. Bastaria dizer, que da atração inaugural que deu a largada na TV Tupi paulista, restam poucas e imprecisas fotos. Outros momentos importantes foram dizimados nas cinzas dos muitos incêndios que acometeram as emissoras ou do simples descaso, que denotava ao meio um grade menor entre os meios de comunicação.
Não faz muito tempo, felizmente essa história começou a mudar. Em 1991, foi publicada aquela que, em minha opinião, foi durante muito tempo a principal obra de referência para quem se interessa pelo assunto, o livro “ O Campeão de Audiência”, autobiografia de Walter Clark, durante 11 anos o executivo major da TV Globo, assinada em parceria com o jornalista Gabriel Priolli.
Ao longo dos anos, outros livros, com maior ou menor grau de legibilidade, vieram para preencher essa lacuna histórica, trazendo informações que, uma vez analisadas de forma macro, traçam um panorama do desenvolvimento do nosso maior meio de comunicação. O quase findo 2011 trouxe um marco nessa bibliografia com a publicação do essencial “O Livro do Boni”, que se junta ao “O Campeão de Audiência”, na prateleira mais alta das obras que tratam do assunto.
Independente de qualquer coisa, o livro já é importante só por trazer o depoimento do homem que fez a Rede Globo, primeiro como o responsável pela produção diferenciada que elevaria o patamar da emissora carioca a algo inédito nas nossas artes áudio visuais, e depois, substituindo o demitido Walter Clarck como o Head da Vênus Platinada até a sua saída, em 1998, após 31 anos.
Mas fora a importância e o impacto de seu nome, Boni não se furtou a fazer um livro verdadeiro, de leitura simples e fácil e que repassa a sua carreira desde os primórdios de aprendiz no Rádio (onde foi aluno de ninguém menos que Dias Gomes), passando por suas primeiras experiências na televisão, o longo casamento com a publicidade , até finalmente voltar à telinha, experimentado e com uma visão gerencial do meio praticamente imbatível, colocando em prática suas idéias em várias emissoras (com graus variados de fracasso) até finalmente aportar na TV Globo, em 1967, trazido pelo já citado Walter Clarck.
“O livro do Boni” destila sinceridade ao avaliar episódios, alguns espinhosos, como a demissão de Walter, decidida unicamente por Roberto Marinho em função, segundo o autor, de uma certa negligência do diretor geral nos assuntos internos da TV, fruto dos seus abusos em álcool e drogas, ainda segundo Boni. O fato é que, desde da implantação da rede, em 1969, quando as operações locais da Globo-RJ e da TV Paulista foram centralizadas, toda a operação era comandada por Boni assessorado pelo grupo composto por Borjalo, Joe Wallace, Armando Nogueira, Arce e Daniel Filho. Após 1977, Boni ascende ao cargo de Superintendente (a direção geral com outro nome) e passa a ser o manda chuva de direito, pois de fato já o era.
As relações sempre delicadas com artistas e criadores são relatadas sem rodeios, como a crise que culminou na saída de Glória Magadan e a ascensão de Daniel Filho e Janete Clair ao Olimpo da dramaturgia global; os atritos com programas que não correspondiam à qualidade esperada (com o advento dos terríveis memorandos); a administração das diversas vaidades, etc.
Boni também não foge da polêmica ao abordar episódios em que a Globo saiu chamuscada, como a campanha das Diretas Já (quando a emissora só cobriu a campanha tardiamente, por pressão externa) e o debate do segundo turno da campanha presidencial de 1989, favorecendo Fernando Collor e derrubando o diretor de Jornalismo, Armando Nogueira.
Tais testemunhos, embora como não poderiam deixar de ser, tragam uma carga grande de subjetividade, são o file mignon que tornam a obra um prato cheio para aqueles que buscam entender a nossa comunicação (pois Boni não se atém só à TV, abordando longamente a sua passagem pela publicidade, o que também se constitui em parte fundamental do livro) a partir da segunda metade do século XX. Entendimento esse que não pode prescindir do relato do executivo número um da maior emissora do país. Plim Plim.
2 comentários:
parabéns pela resenha ... li o livro e vc foi, de fato, perfeito sobre o que é o livro.
Bom livro, mas considero o Campeão de audiência melhor, embora para um livro escrito em 4 meses como o do Boni é ótimos, imagina se ele fosse escrever com mais tempo.
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