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A história e repercussão da Bossa Nova

A entrevistada do Blog Desburocratizando é a professora Liliana Bollos, especialista em Bossa Nova, que está lançando o livro Bossa Nova e crítica – Polifonia de vozes na imprensa (Annablume Editora).

A paixão pela música começou dentro de casa para Liliana. Sua mãe estudou piano clássico até o sexto ano do conservatório, em São Paulo, e seu pai também tocava este instrumento mesmo sem tê-lo estudado. Assim, ela começou a estudar música antes dos seis anos. Viajou para a Áustria onde tirou o diploma em piano-jazz na Universidade de Artes de Graz, sob orientação de Harry Neuwirth. Atualmente, é professora de harmonia e percepção no departamento de MPB/Jazz do Conservatório de Tatuí - SP; na EMESP Tom Jobim, leciona história da música popular. Para saber mais sobre a autora, entre no site http://musicosdobrasil.com.br/liliana-bollos

Confira, abaixo, a entrevista exclusiva de Liliana sobre a história e a repercussão da Bossa Nova em nosso país.

1. Qual o contexto histórico que marcou o aparecimento da bossa nova?

A política de JK (50 anos em 5) imprimiu um modelo que foi seguido também pelas artes, de modo geral, embora, mesmo o que não dependia desse espírito otimista do presidente contribuía para dar feição aos anos JK. Por exemplo, no futebol, o Brasil conquistou sua primeira Copa do Mundo em 1958 e ao mesmo tempo surgiu Pelé, figura emblemática, cuja carreira se desenvolveu também nesses anos.

Essa idéia de incorporação de tudo o que era novo e moderno passou a representar o governo JK, como o desenvolvimento, as estradas, as hidroelétricas, a arquitetura moderna, o cinema novo, a música. Moderno, novo, futuro, faziam parte dos sonhos, das utopias no Brasil. “Brasil, país do futuro”.

2. Qual foi a grande inovação que marcou este estilo musical?

João Gilberto é o nome que sintetizou as características que a Bossa Nova viria a ter. Suas execuções de canções bossanovistas junto com canções de décadas anteriores determinaram um novo modo de escuta, ou pelo menos despertou curiosidade.

Do ponto de vista da letra, passaram a tratar de assuntos mais amenos, como o próprio título do disco de João Gilberto denota “O amor, o sorriso e a flor”. Na harmonia e melodia, novos caminhos com diversos acordes mais sofisticados, com uso de “graus altos” como 9ª, 13ª, #11, deixando a música mais complexa e melodias com intervalos menos usuais. No ritmo o violão de João Gilberto impôs uma nova batida, aliada, claro, com o modo bem pessoal dele cantar. Os arranjos foram ficando menos densos (pelo número de instrumentos) e mais interessantes (pelo número de vozes), tendo a oportunidade de algum solista aparecer além do cantor, por ex.

3. Falando especificamente sobre a imprensa, como que a bossa nova foi recebida pela crítica especializada?

O livro BOSSA NOVA E CRÍTICA: POLIFONIA DE VOZES NA IMPRENSA é fruto de um estudo de doutorado que intitulei Um exame da Bossa Nova pela crítica jornalística: renovação na música popular sob o olhar da crítica desenvolvido no Departamento de Comunicação e Semiótica da PUC-SP em 2007. Na análise distingui três grupos distintos de crítica: a primeira, que vai do aparecimento de João Gilberto e a erupção de Chega de saudade em 1958 até os preparativos do concerto no Carnegie Hall em Nova Iorque em 21/11/1962. O segundo momento da recepção, o mais representativo, tumultuado e polêmico, é o próprio mês subseqüente ao concerto, quando as mais diversas tendências de crítica vão se colocar. Este terceiro momento, logo depois do grande debate, a Bossa Nova é recepcionada por uma crítica bem menos tumultuada e tendenciosa, mas determina um outro tipo de recepção. Nesse momento vários críticos se colocam com o interesse de buscar uma reflexão acerca daquele movimento renovador. Havia, naturalmente, um grupo francamente a favor e o do contra, como em toda nova estética que aparece. Mas havia críticos que estavam interessados em entender o que estava acontecendo, eram os críticos com conhecimento musical ou musicólogos, que discorreram de vários assuntos musicais em seus trabalhos. Isso é valioso!

4. Por que hoje não há tanto espaço nos veículos de comunicação para os novos e os grandes nomes desse estilo?

Com as novas mídias digitais, houve uma diluição do conhecimento, da divulgação, dos meios de comunicação, dos artistas, de tudo. Parece que as pessoas querem conhecer tudo, mas de forma menos específica. Parece que somos obrigados a consumir muito e rápido.

Há, hoje em dia, novos meios de comunicação, novos artistas, outros lugares para a crítica, com os novos leitores, a crítica se encontra também nesses novos formatos, como as revistas eletrônicas e blogs, que aos poucos vão encontrando seus leitores e parceiros. O que quero evidenciar com isso é que o espaço da crítica hoje é múltiplo, talvez até mais amplo que em épocas passadas quando poucos críticos dominavam um cenário cultural, monopolizando não só leitores, mas referendando, através de escolas de pensamento crítico, também as formas de pensar a cultura. Acredito que hoje há mais oportunidade de aparecer “novos” artistas do que antigamente. O problema é achá-los nessa vasta cadeia de opções.

5. Há quem diga que a bossa nova é mais valorizada no exterior do que no próprio Brasil. Você compartilha desta opinião?


Sim. Mas acontece o tempo todo por aqui. Os poetas concretos (Haroldo e Augusto de Campos e Décio Pignatari, entre outros) tiveram mais reconhecimento fora. Há várias músicas brasileiras de qualidade, temos o privilégio de ter Jobim, os mineiros do Clube da Esquina, Pixinguinha, Ernesto Nazareth, Jacob do Bandolim e tantos outros grandes músicos. Carmen Miranda fez sucesso lá fora e foi muito criticada aqui. Muitos artistas brasileiros conseguem se apresentar em palcos estrangeiros tocando música popular brasileira, não somente Bossa Nova. Jobim dizia que ele não era compositor de bossa nova e sim de música popular brasileira. Nossa música é aceita lá fora, principalmente a Bossa Nova, que é tocada há 50 anos e traduzida, o que facilita muito o seu acesso em diferentes grupos, mas aqui também se ouve boa música, precisamos é procurar por ela.

6. Por fim, você poderia listar 10 clássicos da bossa nova?

Difícil. Vamos lá!

1. Chega de saudade (Jobim/Vinicius)

2. Desafinado (Jobim/Newton Mendonça)

3. Samba de uma nota só (Jobim/Newton Mendonça)

4. Garota de Ipanema (Jobim/Vinicius)

5. Rapaz de bem (Johnny Alf) composta antes, foi muito ouvida e estudada.

6. Triste (Jobim)

7. Wave (Jobim) (composta um pouco depois, mas muito difundida)

8. O barquinho (Menescal/Bôscoli)

9. Samba de verão (M Valle)

10. Insensatez (Jobim/Vinicius)

Eu colocaria ainda Batida Diferente (Mauricio Einhorn/Durval Ferreira) e Influência do Jazz (Carlos Lyra/Ronaldo Bôscoli)

4 comentários:

Anônimo | 15 de dezembro de 2010 às 00:08

E tem gente que acha que funk é música ...

Anônimo | 15 de dezembro de 2010 às 00:47

VIVA A BOSSA NOVA

Anônimo | 15 de dezembro de 2010 às 09:12

Passei a minha infância e juventude ouvindo os grandes mestres da Bossa Nova.

Que saudade daqueles tempos.

Anônimo | 15 de dezembro de 2010 às 17:30

Belíssima essa lista final.

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